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EFETIVIDADE DA QUARENTENA CHINESA LEVANTA QUESTIONAMENTOS

Atualizado: 21 de mar. de 2022

O posicionamento da China traz reflexões sobre a decadência da liberdade de expressão.


Por Elisa Romera de Freitas

Edição por Reyel Moreira de Souza



“Quarentena é um tipo de reclusão aplicado a determinado grupo de pessoas sadias, mas que podem ter sido contaminadas pelo agente causador de alguma doença, a fim de evitar que ela espalhe-se” || Foto/Reprodução: Pixabay

Algo de errado acontecia no Mercado Atacadista de Frutos do Mar de Huanan. As últimas semanas de 2019, aflitas por uma estranha febre que acometia muitos trabalhadores, despertaram desconfiança no vendedor de carne Hu Xiaohu, que observou seus conhecidos serem direcionados a quarentenas hospitalares, para ele misteriosas.


Esse foi o relato trazido pelos escritores Chris Buckley e Steven Lee Myers no The New York Times, posteriormente reproduzido pela Folha de São Paulo.


No primeiro dia de janeiro a polícia entrou em ação em uma tentativa de, com uma “limpeza ambiental e higiênica", combater o autor do surto pneumônico. Isso, um dia após o alerta oficial da doença à OMS em Pequim.


Assim, estabelecia-se a decadência da saúde pública que tomou todo o globo. Uma ameaça desconhecida, com um potencial disseminativo aterrorizante e jamais esperado, pôs fim às vidas chinesas e, também, à credibilidade da nação.


Julgada por seu suposto atraso ao denunciar o potencial perigo, a China, novamente, assumiu o papel de vilã que, “propositalmente”, escondia uma doença para evitar constrangimentos políticos.



Porém, a vil nação, contrária à tendência mundial, apresentou uma repressão rápida e eficiente ao vírus. Com rígidas políticas de distanciamento social, o país não teve medo de paralisar sua população e seu comércio.


A membra sênior na Universidade de Negócios Internacionais e Economia, em Pequim, Tatiana Prazeres relata à Folha de São Paulo, em sua coluna “Quarentena chinesa é para valer, o resto é fichinha”, publicada em setembro de 2020, a enorme discrepância entre os esforços adotados aqui e aqueles no hemisfério oposto.


Durante uma intensa viagem de Florianópolis a Pequim, em busca de evitar permanecer distante de sua família, a colunista compartilha a criteriosa inflexibilidade do distanciamento requisitado para circular pelas ruas da capital:


“Quarentena chinesa é para valer, o resto é fichinha. São 15 dias num quarto de hotel-alojamento. O quarto é literalmente lacrado, com faixas na porta, daquelas que isolam cenas de crime, servindo de lembrete do bloqueio.”

Da janela do hotel, era visível uma realidade alternativa à dos brasileiros: pessoas andando livremente pelas ruas, sem preocupação com o uso de máscaras, já que, por três semanas, não havia a ocorrência de contaminações locais.


O sucesso na batalha de saúde pública, irreconhecível aos olhos estrangeiros, obviamente, levantou suspeitas de todos os lados. Como seria possível um país de mais de um bilhão de habitantes ter apenas 90 mil contaminados e quatro mil mortes?


A única resposta concebível seria que a China, como sempre, sob seu papel de mal intencionada, estaria manipulando os dados divulgados sobre o surto.


Com um governo autoritário socialista, os ocidentais interpretaram que a divulgação de informações centralizada pelo Estado seria, necessariamente, irreal - conclusão irônica, já que as informações de relevância nacional costumam, em grande parte de países democráticos, também ser da ordem de institutos públicos, raramente privados.


O termo “xenofobia” tem como etimologia duas palavras gregas: xénos, que significa “estrangeiro”, e phóbos, que significa “medo”|| Foto/Reprodução: Carlos Latuff, Brasil 247

Para além de uma análise puramente sinofóbica, foram desenvolvidos estudos analíticos sobre a veracidade do número de contágio. Uma dessas averiguações foi abordada pela Folha de São Paulo na matéria do repórter Matheus Moreira, chamada “Estudo sugere que governo chinês restringe dados sobre coronavírus”:


“O estudo realizado pela Imperial College sugere que os casos confirmados pelo governo chinês são baixos demais, de maneira que não seria possível que outros países também tivessem casos da doença sem que uma parcela populacional mais expressiva de Wuhan tivesse sido infectada”, explica.

Em contrapartida, para alguns é incompreensível como tamanha manipulação passaria despercebida pelos vizinhos da ardilosa China. O biólogo Atila Iamarino redigiu uma lista de tweets compartilhando as inconsistências dessas acusações:



Recheada de denúncias às censuras governamentais, a matéria explicita a persistente tentativa de controlar os relatos públicos sobre a doença.

Por mais estranho que nos pareça, o controle da liberdade de expressão está a cada dia se aproximando da realidade democrática. Permitir a circulação de informações falsas que ameaçam a organização civil e causam pânico é realmente uma prioridade defendida pela democracia?


Não há diferenças palpáveis entre uma política de proteção à ordem pública e a “PL das Fake News” que atualmente é avaliada no Brasil. Ambas buscam o controle responsável de informação, mas também podem ser utilizadas como arma de censura. Até mesmo o Reino Unido, respeitável símbolo da democracia, adota medidas de controle de imprensa. Correta ou não, essa tendência não é exclusivamente chinesa.

A verdade é que, na pós-modernidade, a liberdade de expressão está em um impasse. O bem fornecido pela alta taxa disseminativa de informações é ameaçado pela mesma velocidade com que são propagadas inverdades apelativas. A proposta emancipatória da divulgação massiva do acesso ao conhecimento é a mesma que, muitas vezes, ameaça a própria liberdade em um eterno ciclo de autossabotagem e ignorância.

E você, o que acha dos perigos apresentados pela infodemia? Deveria a liberdade de expressão ser regulada pelo governo federal? Para compartilhar suas ideias sobre essa difícil questão, acesse nosso fórum.

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